"Vazio. Adorável e assustador vazio. Adorável porque há ausência de sensações ruins, de desconforto, de medo, tristeza; há leveza e tranqüilidade. Assustador, porque não estamos acostumados a isso e tudo o que é diferente e novo nos assusta;
assustador porque há ausência de tudo, não sentimos nada... ou melhor não sentimos os mesmos sentimentos e emoções que antes experimentávamos com tanta intensidade; assustador porque, aparentemente, tudo fica sem sentido, pois antes, tudo o que desejávamos fazer, nos custava muito, nos deixava ansiosos e essa ansiedade, apesar de ruim, fazia com que nos movimentássemos, com que desejássemos, com que tivéssemos impulsos.
Não nos importava o significado de nossos desejos, o que nos importava, inconscientemente, era termos motivações, era termos um sentido para nossa vida. Mas este sentido era proveniente do Ego e não do coração.
Esse movimento intenso e, muitas vezes, frenético, fez com que acreditássemos que isso era vida. Sem isso, parece-nos que a vida está se esvaindo. Mas tudo era ilusão, pois não havia vida dentro dessa intensidade, somente havia movimentos altamente suicidas, pois sempre estávamos nos desafiando, nos colocando em situações de risco - não falo de riscos físicos somente, mas dos graves riscos emocionais e mentais em que tanta ansiedade e aflições nos colocava -;
muitas vezes, nos ferimos justamente por insistirmos em prosseguir nos mesmos caminhos, incansáveis e teimosos, nunca parávamos para reconhecer que os caminhos que estávamos trilhando, guiados pelo Ego, sempre nos levavam aos mesmos resultados, geralmente insatisfatórios, frustrantes, ilusórios, decepcionantes e, o pior, muito dolorosos.
Viver em intenso movimento e agitação interna, com o Ego sempre querendo, buscando, pensando, planejando, foi tudo o que nos foi oferecido de modelo e foi o que aceitamos como modelo.
Portanto, dentro desse padrão, acreditamos que existimos, fora do padrão, onde há serenidade e ausência de intensidade em nossas buscas, a sensação que temos é que deixamos de existir.
Quando entramos no vazio, principalmente no vazio que é encontrado através do autoconhecimento, é prazeroso sentir que podemos parar e descansar, mas o Ego não quer parar, ele não se conforma com isso, porque experimenta a sensação de morte e isso é assustador; então, pela não aceitação, ele luta incessantemente contra essa morte e faz de tudo para continuar em movimento.
Nesse luta contra a nova realidade, o Ego entra em "pânico" e a sensação que podemos experimentar é literalmente de sintomas físicos de pânico, sensações de enjôo, vertigem, corpo gelado, sensação de paralisação, taquicardia e outros.
Quanto mais lutamos contra essa sensação de perda de nossas capacidades e de controle, mais pioramos. Se isto ocorrer, devemos entrar nessas sensações e aceitarmos, nos acolhendo. Fazendo isso, logo as sensações cessarão.
Então, se conseguimos compreender e aceitar essa dinâmica causada pelas reais mudanças internas que conquistamos que, consequentemente, nos remeteram ao vazio, e se conseguirmos aceitar essa fase de transição, mesmo com os mais horríveis desconfortos, poderemos relaxar nessa aceitação - afinal, de nada adiantará lutarmos contra algo que ESTÁ ACONTECENDO conosco - e, nesse relaxamento, poderemos nos entregar mais profundamente ao vazio.
Sei que pode parecer ainda mais assustador pensar em nos entregarmos dessa forma, mas este pensamento é proveniente da necessidade do Ego em resistir à essa idéia.
Devemos compreender e acolher as necessidades do Ego em lutar pela vida, em seus medos e instintos ignorantes de sobrevivência, já que ele entende que isso é morte. Mas devemos também, contar para o Ego que não há outra saída a não ser nos entregarmos ao vazio, sendo firmes com ele, assumindo o poder, nos deixando levar pelo vazio, numa entrega sem reservas.
Devemos partir para uma meditação com essa intenção de entrega,
assim, poderemos nos imaginar deitados confortavelmente em uma canoa, que está sendo levada pelo fluxo calmo de um rio, que está nos conduzindo suavemente aos braços do vazio... as sensações poderão ser variadas, desde extremo desconforto, até sensação de "ausência", ou de paz; e devemos aceitar e acolher todas as sensações que experimentarmos, estando presentes, atentos às nossas reações, nos acolhendo, como quem acolhe uma criança que está com medo de passar por algo que ela tem que passar.
Assim, neste exercício, procurando zerar expectativas, sem pensarmos sobre onde isso nos levará, quando menos esperarmos, estaremos atracando no porto da segurança. Mas não será uma segurança igual à que conhecemos em nossas limitadas percepções do Ego; será uma segurança indescritível.
Essa segurança é no sentido de que não nos importará mais saber o que tem que ser feito, saber o que vai acontecer, controlar os eventos; essa segurança faz com que simplesmente estejamos tão entregues à vida, que saberemos, com a força de nosso coração, que apesar de não termos nenhuma previsão sobre nossos próximos passos, que existe, dentro de nós, uma forte tranqüilidade e certeza de que tudo está certo e de que tudo acontecerá de acordo com o fluxo natural da vida, a partir do momento em que estamos entregues, aceitando o comando de nosso ser real, nosso Espírito.
Neste vazio, chegamos ao nosso ponto zero, que é onde tudo se cria. Enquanto somos comandados pelo Ego, que reage aos estímulos e modelos do mundo exterior, não criamos nada, apenas copiamos, transformamos ou reformamos o que já existe.
Assim, entregues ao vazio, que nos leva ao nosso ponto zero, estaremos conectados ao ponto do zero absoluto da Mente e do Coração de Deus. Este é o único ponto de criação verdadeiro que existe. Dessa forma, não precisaremos saber o que precisamos fazer, apenas sentiremos que temos o que fazer e que saberemos, dentro de cada momento, o que e como fazer.
Não nos importará mais termos certeza de nossos passos, pois sentiremos um forte impulso interior que nos guiará e nos colocará na vida de forma sábia, sem ansiedade, sem racionalizações. É muito sublime viver a experiência de estarmos nesse ponto zero.
Então, se nada em sua vida estiver fazendo sentido, se você estiver com a sensação de não saber o que está acontecendo dentro de si e se estiver se sentindo vazio, ao invés de correr disso e ficar assustado, fique feliz. E busque meios para conseguir enfrentar esse momento, com sabedoria e discernimento, para que consiga chegar às profundezas desse sublime vazio, que te levará ao seu ponto zero onde a criação é real e tudo começa"...
Autor:Teresa Cristina Pascotto