21 de março de 2015

Cada um tem seu deserto a atravessar por Jean-Yves Leloup

"O que evoca para nós a palavra deserto? Silêncio, imensidão, vento abrasador? Não apenas. Evoca também sede, miragens, escorpiões... e o encontro do mais simples de si mesmo no olhar assombrado e surpreso do homem ou da criança que brota não se sabe de onde – entre as dunas.

Existem os desertos de pedras e de areias, o deserto do Hoggar, de Assekrem, de Ténéré e do Sinai e de outros lugares ainda... o deserto é sempre o alhures, o outro lugar, um alhures que nos conduz para o mais próximo de nós mesmos.

Existem os desertos na moda, onde a multidão se vai encontrar como um pode tagarelar, em espaços escolhidos, onde nos serão poupadas as queimaduras do vento e as sedes radicais; deles se volta bronzeado como de uma temporada na praia, mas ainda por cima, com pretensões à “grande experiência”, que nos transformaria para sempre em “grandes nômades”...

Existem, enfim, os desertos interiores.
 Temos que falar deles, saber reconhecer o que apresentam de doloroso e tórrido, mas tentando também descobrir, aí, a fonte escondida, o oásis, a presença inesperada que nos recebe, debaixo de uma palmeira sorridente, em redor de uma fogueira onde a dança dos “passantes” se junta à das estrelas. Pois o deserto não constitui uma meta; é, antes, um lugar de passagem, uma travessia. Cada um, então, tem a sua própria terra prometida, sua expectativa que deverá ser frustrada, sua esperança a esclarecer.

Algumas pessoas vivem esta experiência do deserto no próprio corpo; quer isto se chame envelhecer, adoecer ou sofrer as conseqüências de um acidente. Esse deserto às vezes demora muito a ser atravessado.
Outras pessoas vivem o deserto no coração das suas relações, deserto do desejo ou do amor, das secas ou dos aborrecimentos que não aprendemos a compartilhar.
Há também os desertos da inteligência, onde o mais sábio vai esbarrar no incompreensível e o mas consciente no impensável. 

Só conseguimos conhecer o mundo e as suas matérias, a nós mesmos e às nossas memórias quando atravessamos os desertos.

Temos, finalmente, o deserto da fé, o crepúsculo das idéias e dos ídolos, que havíamos transformado em deuses ou em um Deus, para dar segurança às nossas impotências e abafar as nossas mais vivas perguntas.
Cada pessoa tem seu próprio deserto a atravessar. E a cada vez será necessário desmascarar as miragens e também contemplar os milagres: o instante, a aliança, a douta ignorância e a fecunda vacuidade."

Autor:Jean-Yves Leloup
Fonte:http://muraldaexistencia.blogspot.com.br/

13 de março de 2015

Poema Se... do professor Hermógenes


"Se, ao final desta existência,
Alguma ansiedade me restar
E conseguir me perturbar;
Se eu me debater aflito
No conflito, na discórdia…

Se ainda ocultar verdades
Para ocultar-me,
Para ofuscar-me com fantasias por mim criadas…

Se restar abatimento e revolta
Pelo que não consegui
Possuir, fazer, dizer e mesmo ser…

Se eu retiver um pouco mais
Do pouco que é necessário
E persistir indiferente ao grande pranto do mundo…

Se algum ressentimento,
Algum ferimento
Impedir-me do imenso alívio

Que é o irrestritamente perdoar,

E, mais ainda,
Se ainda não souber sinceramente orar
Por quem me agrediu e injustiçou…

Se continuar a mediocremente
Denunciar o cisco no olho do outro
Sem conseguir vencer a treva e a trave
Em meu próprio…

Se seguir protestando
Reclamando, contestando,
Exigindo que o mundo mude
Sem qualquer esforço para mudar eu…

Se, indigente da incondicional alegria interior,
Em queixas, ais e lamúrias,
Persistir e buscar consolo, conforto, simpatia
Para a minha ainda imperiosa angústia…

Se, ainda incapaz
para a beatitude das almas santas,
precisar dos prazeres medíocres que o mundo vende…

Se insistir ainda que o mundo silencie
Para que possa embeber-me de silêncio,
Sem saber realizá-lo em mim…

Se minha fortaleza e segurança
São ainda construídas com os materiais
Grosseiros e frágeis
Que o mundo empresta,

E eu neles ainda acredito…

Se, imprudente e cegamente,
Continuar desejando
Adquirir,
Multiplicar,
E reter

Valores, coisas, pessoas, posições, ideologias,
Na ânsia de ser feliz…
Se, ainda presa do grande embuste,
Insistir e persistir iludido
Com a importância que me dou…

Se, ao fim de meus dias,
Continuar
Sem escutar, sem entender, sem atender,
Sem realizar o Cristo, que,
Dentro de mim,
Eu Sou,

Terei me perdido na multidão abortada
Dos perdulários dos divinos talentos, 
os talentos que a Vida
A todos confia,
E serei um fraco a mais,
Um traidor da própria vida,
Da Vida que investe em mim,
Que de mim espera
E que se vê frustrada
Diante de meu fim.

Se tudo isto acontecer
Terei parasitado a Vida
E inutilmente ocupado
O tempo
E o espaço
De Deus.

Terei meramente sido vencido
Pelo fim,
Sem ter atingido a Meta.

ENTREGO, CONFIO, ACEITO E AGRADEÇO!"

Professor Hermogenes ...no livro Canção Universal..
  muita luz grande alma,que neste dia retornou para a patria espiritual!
Fonte:http://www.yogajournal.com.br/sabedoria/luto/

12 de março de 2015

ATempestade por Gibran Khalil Gibran

"O pássaro e o homem tem essências diferentes. 
O homem vive à sombra de leis e tradições por ele inventadas; 
o pássaro vive segundo a lei universal que faz girar os mundos. 

Acreditar é uma coisa; viver conforme o que se acredita é outra. 
Muitos falam como o mar, mas vivem como os pântanos. 
Muitos levantam a cabeça acima dos montes; 
mas sua alma jaz nas trevas das cavernas. 

A civilização é uma arvore idosa e carcomida, 
cujas flores são a cobiça e o engano e cujas frutas 
são a infelicidade e o desassossego. 

Deus criou os corpos para serem os templos das almas. 
Devemos cuidar desses templos para que sejam dignos da divindade que neles mora. 

Procurei a solidão para fugir dos homens, de suas leis, de suas tradições e de seu barulho. 
Os endinheirados pensam que o sol e a lua e as estrelas se levantam dos seus cofres e se deitam nos seus bolsos. 
Os políticos enchem os olhos dos povos com poeira dourada e seus ouvidos com falsas promessas. 
Os sacerdotes aconselham os outros, mas não aconselham a si mesmos, 
e exigem dos outros o que não exigem de si mesmos. 

Vã é a civilização. E tudo o que está nela é vão. 
As descobertas e invenções nada são senão brinquedos com a mente a se divertir no seu tédio. 
Cortar as distâncias, nivelar as montanhas, vencer os mares, tudo isso não passa de 
aparências enganadoras, que não alimentam o coração e nem elevam a alma. 
Quanto a esses quebra-cabeças, chamados ciências e artes, nada são senão cadeias douradas com os quais o homem 
se acorrenta, deslumbrados com seu brilho e tilintar. 
São os fios da tela que o homem tece desde o inicio do tempo sem saber que, quando terminar sua obra, terá construído a prisão dentro da qual ficará preso.
 
Uma coisa só merece nosso amor e nossa dedicação, 
uma coisa só... 
É o despertar de algo no fundo dos fundos da alma. 
Quem o sente não o pode expressar em palavras. 
E quem não o sente, não poderá nunca conhecê-lo através de palavras. 
Faço votos para que aprendas a amar as tempestades em vez de fugir delas."

Gibran Khalil Gibran (1883-1931)

8 de março de 2015

Reflexões e o sentido da vida por Viktor Emil Frankl


"Encontrei o significado da minha vida, ajudando os outros a encontrarem o sentido de suas vidas.” (Viktor Emil Frankl)

REFLEXÕES

“Até que ponto sou livre?”
pergunta o homem ao seu Criador.

“Não posso despojar-me do meu corpo,
não posso renegar minhas origens,
não posso fugir do meu ambiente,
não posso escapar do meu tempo.”
“Tu não és livre de tuas condições,
responde Ele,
porém, tu és livre para te posicionares
diante de teus condicionamentos.
E isto é muito além do que jamais concedi.”

“Quando giro em torno de mim mesmo, percorro um caminho infinito,
que não leva a lugar algum.
Porém, ao distanciar-me de mim mesmo, percebo o caminho
para a pessoa que gostaria de ser.”

“Há uma responsabilidade diante de meus atos:
sou responsável pelo que faço, digo, decido...
Mas há também uma responsabilidade
pela maneira como os faço:
sou responsável pelo modo como vivo, amo e sofro...”

“O corpo não pode ser construído,
mas o mal-estar físico pode ser mitigado.
A alma não pode ser consertada,
mas o distúrbio psíquico pode ser curado.
O espírito não pode ser produzido,
mas a dimensão espiritual pode ser despertada.”
“O que é genuíno não pode ser desmoralizado,
o que não é mascarado não pode ser desmascarado,
o que tem sentido não pode ser questionado.”

“Um corpo estranho penetra na concha, ferindo-a.
A areia áspera machuca sua carne.
A concha sofre.
A concha tenta expelir o intruso e fracassa.
O grão de areia fixou-se.
A dor não pode ser eliminada.
Então o animal, a partir do âmago da sua natureza,
busca a força para transformar o sofrimento em triunfo.
Do sofrimento e da aflição,
da seiva de suas lágrimas, surge,
em longos processos de crescimento interior,
a pérola.”

Textos retirados do livro “Tudo tem seu sentido”
Coleção Logoterapia
Elisabeth S. Lukas

1 de março de 2015

Ética para a nova era.. de Leonardo Boff

"Nenhuma sociedade no passado ou no presente vive sem uma ética. Como seres sociais, precisamos elaborar certos consensos, coibir certas ações e criar projetos coletivos que dão sentido e rumo à história. Hoje, devido ao fato da globalização, constata-se o encontro de muitos projetos éticos nem todos compatíveis entre si. Face à nova era da humanidade, agora mundializada, sente-se a urgência de um patamar ético mínimo que possa ganhar o consentimento de todos e assim viabilizar a convivência dos povos. Vejamos, suscitamente, como na história se formularam as éticas. 

Uma permanente fonte de ética são as religiões. Estas animam valores, ditam comportamentos e dão significado à vida de grande parte da humanidade que, a despeito do processo de secularização, se rege pela cosmovisão religiosa. Como as religiões são muitas e diferentes, variam também as normas éticas. Dificilmente se pode fundar um consenso ético, baseado somente no fator religioso. Qual religião tomar como referência? A ética fundada na religião possui, entretanto, um valor inestimável por referi-la a um último fundamento que é o Absoluto. 

A segunda fonte é a razão. Foi mérito dos filósofos gregos terem construído uma arquitetônica ética fundada em algo universal, exatamente na razão, presente em todos os seres humanos. As normas que regem a vida pessoal chamaram de ética e as que presidem a vida social chamaram de politica. Por isso, para eles, politica é sempre ética. Não existe, como entre nós, politica sem ética. 

Esta ética racional é irrenunciável mas não recobre toda a vida humana, pois existem outras dimensões que estão aquém da razão como a vida afetiva ou além como a estética e a experiência espiritual. 

A terceira fonte é o desejo. Somos seres, por essência, desejantes. O desejo possui uma estrutura infinita. Não conhece limites e é indefinido por ser naturalmente difuso. Cabe ao ser humano dar-lhe forma. Na maneira de realizar, limitar e direcionar o desejo, surgem normas e valores.

 A ética do desejo se casa perfeitamente com a cultura moderna que surgiu do desejo de conquistar o mundo. Ela ganhou uma forma particular no capitalismo no seu afã de realizar todos os desejos. E o faz excitando de forma exacerbada todos os desejos. Pertence à felicidade, a realização de desejos mas, atualmente, sem freios e controles, pode pôr em risco a espécie e devastar o planeta. Precisamos incorporá-la em algo mais fundamental. 

A quarta fonte é o cuidado, fundado na razão sensível e na sua expressão racional, a responsabilidade. O cuidado está ligado essencialmente à vida, pois esta, sem o cuidado, não persiste. Dai haver uma tradição filosófica que nos vem da antiguidade (a fábula-mito 220 de Higino) que define o ser humano como essencialmente um ser de cuidado. 

A ética do cuidado protege, potencia, preserva, cura e previne. Por sua natureza não é agressiva e quando intervem na realidade o faz tomando em consideração as consequências benéficas ou maléficas da intervenção. Vale dizer, se responsabiliza por todas as ações humanas. Cuidado e responsabilidade andam sempre juntos. 

Essaa ética é hoje imperativa. O planeta, a natureza, a humanidade, os povos, o mundo da vida (Lebenswelt) estão demandando cuidado e responsabilidade. Se não transformarmos estas atitudes em valores normativos dificilmente evitaremos catástrofes em todos os níveis. Os problemas do aquecimento global e o complexo das varias crises, só serão equacionados no espírito de uma ética do cuidado e da responsabilidade coletiva. É a ética da nova era. 

A ética do cuidado não invalida as demais éticas mas as obriga a servir à causa maior que é a salvaguarda da vida e a preservação da Casa Comum para que continue habitável."
Autor:Leonardo Boff
Fonte:http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=993

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