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21 de novembro de 2011

O MEDO – Krishnamurti


(...)"Considerai agora vosso temor particular. Olhai-o. Observai vossas reações a ele. Podeis olhá-lo sem nenhum movimento de fuga, de justificação, condenação ou repressão? Podeis olhar aquele medo, sem a palavra que causa medo? Podeis olhar a morte, por exemplo, sem a palavra que suscita o medo da morte? A própria palavra produz um estremecimento, não é exato? — assim como a palavra amor produz seu estremecimento, sua imagem peculiar. Pois bem; a imagem que tendes na mente a respeito da morte, a lembrança de tantas mortes a que assististes, e o relacionar a vossa pessoa com tais incidentes — é essa a imagem que está criando o medo? Ou, com efeito, tendes medo do findar e não da imagem que cria o fim? É a palavra morte que vos causa medo ou é o próprio findar? Se é a palavra ou a memória que vos está causando medo, então não se trata realmente do medo.

Estivestes doente há dois anos, digamos, e a lembrança daquela dor, daquela doença, persiste, e a memória, agora em funcionamento, diz: “Tem cuidado, para não adoeceres de novo!” Por conseguinte, a memória, com suas associações, está criando o medo, e isso não é realmente medo, porque, com efeito, neste momento estais gozando perfeita saúde. O pensamento, que é sempre velho — pois o pensamento é reação da memória, e as lembranças são sempre velhas — o pensamento cria, no tempo, a idéia que vos faz medo, a qual não é um fato real. O fato real é que estais bem de saúde. Mas, a experiência, que permaneceu na mente como memória, faz surgir o pensamento “Tem cuidado para não adoeceres novamente”.

Estamos vendo, pois, que o pensamento engendra uma espécie de medo. Mas, separado desse, existe realmente medo? É o medo sempre resultado do pensamento? Se é, existe alguma outra forma de medo? Tememos a morte — uma coisa que acontecerá amanhã ou depois de amanhã, no tempo. Há uma distância entre a realidade e o que será. Ora, o pensamento experimentou esse estado; observando” a morte, ele diz: “Eu vou morrer”. O pensamento cria o medo da morte; e, se não o cria, existe então realmente o medo?

É o medo resultado do pensamento? Se é, uma vez que o pensamento é sempre velho, o medo é sempre velho. Como dissemos, não há pensamento novo. Se o reconhecemos, ele já é velho. Portanto, o que tememos é a repetição do velho— o pensamento sobre o que foi, projetando-se no futuro. Por conseguinte, o pensamento é o responsável pelo medo. Isso é um fato que podeis observar por vós mesmo. Quando vos vedes diretamente em presença de alguma coisa, não há medo. Só quando surge o pensamento é que há medo.

Por conseguinte, perguntamos agora: É possível à mente viver de maneira completa, total, no presente? Só assim a mente não tem medo. Mas, para compreender isso, tendes de compreender a estrutura do pensamento,da memória e do tempo. E, compreendendo-a, não intelectual nem verbalmente, porém de maneira real, com vosso coração, vossa mente, vossas entranhas, ficareis livre do medo; a mente pode então servir-se do pensamento, sem criar medo.

O pensamento, como a memória, é naturalmente necessário ao viver. É o único instrumento de que dispomos para nos comunicarmos, para trabalharmos em nossos empregos etc. O pensamento é a reação da memória, memória acumulada por meio de experiência, do conhecimento, da tradição, do tempo. Desse acúmulo de memória é que provêm as nossas reações, e essas reações constituem o pensar.

O pensamento, portanto, é essencial em certos níveis, porém, quando o pensamento se projeta, psicologicamente, como futuro e como passado, criando o medo bem como o prazer, a mente se embota e, por conseguinte, torna-se inevitável a inércia.

Assim, pergunto a mim mesmo: “Mas por que penso no futuro e no passado em termos de prazer e de dor, quando sei que esse pensamento gera medo? Não é possível o pensamento deter-se, psicologicamente, pois de outro modo o medo nunca terá fim?”

Uma das funções do pensamento é estar continuamente ocupado com alguma coisa. Em geral, desejamos ter a mente continuamente ocupada, para nos impedir de ver-nos como realmente somos. Temos medo de sentir-nos vazios. Temos medo de encarar os nossos temores.

Conscientemente, podeis perceber os vossos temores, mas estais cônscio deles nos níveis mais profundos? E como ireis descobrir os temores ocultos,secretos? Pode o medo dividir-se em consciente e inconsciente? Esta é uma pergunta muito importante. O especialista, o psicólogo, o analista, dividiram o medo em camadas profundas e camadas superficiais, mas, se fordes seguir o que diz o psicólogo ou o que eu digo, tereis a compreensão de nossas teorias, de nossos dogmas, de nossos conhecimentos, mas não tereis a compreensão de vós mesmos.
 Não podeis compreender-vos de acordo com Freud, Jung, ou de acordo comigo. As teorias de outras pessoas não têm importância alguma. É a vós mesmo que deveis perguntar se o medo pode ser dividido em consciente e subconsciente. Ou só existe medo, que traduzis de diferentes maneiras? Só existe um desejo; só há desejo. Vós desejais. Os objetivos do desejo variam, mas o desejo é sempre o mesmo. Assim, talvez, da mesma maneira, só existe o medo. Tendes medo de uma porção de coisas, mas só existe um medo.

Ao perceberdes que o medo não pode ser dividido, vereis que acabastes com o problema do subconsciente, pregando um logro aos psicólogos e aos analistas. Ao compreenderdes que o medo é um movimento único que se expressa de diferentes maneiras, e ao verdes o movimento e não o objetivo a que se dirige, estareis então em presença de uma questão imensa: Como olhar o medo sem a fragmentação que a mente cultivou?

So há o medo total, mas como pode a mente que pensa fragmentariamente observar esse quadro total? Pode observá-lo? Temos levado uma vida de fragmentação e só somos capazes de olhar o medo através do processo fragmentário do pensamento. Todo o processo do mecanismo do pensamento é dividir tudo em fragmentos: Eu te amo e eu te odeio; tu és meu amigo, tu és meu inimigo; minhas idiossincrasias e inclinações, meu emprego, minha posição, meu prestígio, minha mulher, meu filho, minha pátria e tua pátria, meu Deus e teu Deus— tudo isso é fragmentação do pensamento.
 E o pensamento olha o estado atual de medo, ou tenta olhá-lo, e o reduz a fragmentos. Vemos, por conseguinte, que a mente só pode olhar esse medo total quando não há movimentação do pensamento".(...)

Autor:Krisnamurti

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