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26 de maio de 2010

O QUE É A FILOSOFIA?

"Essa é uma das perguntas mais irritantes e complicadas de se responder. Talvez a forma menos penosa seja mudar a pergunta. Como assim? Ora, ao invés de privilegiarmos o "o que", daremos atenção ao "como". Continua sem entender? É simples, vou mostrar-lhe.

A melhor maneira de se compreender o que é Filosofia, sem sombra de dúvida, é perguntarmos pelo seu modo peculiar de proceder, sem nos preocuparmos tanto com o que ela estuda ou o que ela é, mas como faz a sua investigação. Desse modo, tão logo estivermos de posse de um texto filosófico, perceberemos que ele possui algumas características compartilhadas por várias outras obras escritas por diferentes filósofos:

Primeiramente, constitui uma análise racional, precisa e rigorosa do(s) tema(s) em questão, num esforço interminável de fundamentar as suas ideias. A forma mais frequente e equivocada de julgar o exercício filosófico é aproximá-lo de uma mera emissão de opiniões e pontos de vista. A filosofia, pelo contrário, a todo momento, tenta afastar as ideias superficiais e preconceituosas - próprias do senso comum – caminhando em direcção às ideias fortes e bem articuladas. Por conseguinte, é indispensável que o trabalho do filósofo prime, antes de mais nada, pela precisão e rigor dos conceitos utilizados e pela preocupação com a lógica e clareza na exposição de seus argumentos. Isso não quer dizer, necessariamente que as obras filosóficas tenham que ser chatas difíceis, mas que apresentam características próprias, específicas da Filosofia.

A análise filosófica preocupa-se com a totalidade e não com partes dos problemas – os problemas parcelares são específicos das ciências. A sociologia, por exemplo, tem por objecto a sociedade, a psicologia, a psique (a alma), a física, os corpos em movimento (as suas leis, estruturas etc.) e assim sucessivamente. Todas essas ciências constituem áreas específicas do saber, que mesmo quando ultrapassam os seus limites com o intuito de solucionar problemas, continuam limitadas às suas perspectivas singulares. Isso não acontece com a Filosofia. O primeiro passo da reflexão filosófica é a (tentativa de) suspensão de tudo o que venha a limitar o carácter abrangente, característico da Filosofia. Assim, o filósofo é aquele que tem por obrigação uma "visão alargada" e razoável do mundo e dos saberes, sendo, desse modo, o questionador mais competente dentre os demais, pois é capaz de unir as diversas perspectivas - quando julga necessário - ou perceber os seus pontos fracos. Não pretendo defender aqui que o filósofo seria um super-homem ser mas uma pessoa com a mente aberta e com a constante preocupação de buscar novas formas de visar os problemas.

É eminentemente crítica. Se o filósofo pretende reflectir sobre os problemas e temas relevantes, para que possa construir uma argumentação coerente e com as características anteriormente abordadas, inevitavelmente, transformará o seu pensamento em crítica: às formas anteriores de abordagem da questão, aos sistemas filosóficos que o antecederam, à tradição e etc. Essa é a forma mais característica do filósofo proceder. No entanto, não se trata de uma crítica ofensiva, mas um pôr-em-questão, de modo a perceber os limites das teorias vigentes e apontar para novas formas de abordagem.

Por fim, o rigor característico de toda actividade racional está frequentemente aliado, no exercício filosófico, à ideia de sistematização. É indispensável na exposição de argumentos, além da clareza e precisão abordados acima que o filósofo reflicta e demonstre de modo sistemático o seu raciocínio. Um conjunto confuso e superficial, com ausência de encadeamento lógico, desqualifica um trabalho que pretende ser filosófico.

Vimos que a filosofia pode ser mais precisamente definida, a despeito de seus inúmeros sistemas e métodos, como uma actividade racional que utiliza procedimentos sistemáticos, rigorosos e precisos de análise e exposição de ideias, sempre a partir de uma postura crítica e coerente.”

Emanuel Fraga

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